Corpo Que Evoca
Renascimento e lama
No ventre pulsante da Amazônia, onde o rio se bifurca e revela suas entranhas, um bolsão de lama se abre como um portal. Ali, com os pés submersos nessa placenta primordial, Sarah Maria dá início ao rito: seu corpo convoca, sua presença desperta. A lama, essa matéria viva, não é só resíduo da terra — é memória fluida, guardiã de histórias e forças ancestrais.
Sarah Maria, com seus pés cravados na lama do rio, inscreve um novo mito: o da mulher que não apenas emerge, mas que sempre esteve ali, guardada pela terra úmida, esperando o momento certo para se refazer em esplendor.
o processo
A artista pisa na lama como quem retorna a um útero cósmico, evocando não apenas o feminino, mas a própria gênese. Seu corpo torna-se extensão das águas turvas, um reflexo de Ana Mendieta em Silueta, onde a artista esculpia sua presença na terra para afirmar existência e pertencimento. Aqui, no coração da floresta, Sarah Maria não apenas marca o território — ela é território.
Há em sua performance a mesma entrega de Marina Abramović, mas sem a dor do sacrifício — aqui, o feminino renasce não pelo sofrimento, mas pelo rito da terra que a acolhe e a transforma. Seu caminhar sobre a lama invoca todas as mulheres cujos pés já afundaram em rios e lendas, nas margens de histórias que tentaram apagar. Mas nada se apaga na Amazônia — tudo renasce, tudo resiste.